CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL DE 1988
https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constitui%C3%A7ao.htm
Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:
IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
XLII - a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei;
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Programa Brasil, Gênero e Raça
combate à discriminação em matéria de emprego e ocupação
Ministério do Trabalho e Emprego
Assessoria Internacional – Brasil
http://www.mte.gov.br/Temas/FiscaTrab/ProgramaCombate/default.asp
http://www.ilo.org/public/spanish/region/ampro/cinterfor/temas/gender/nov/p_brasil.htm
Implementação no Brasil da Convenção N.º 111 da OIT (Organização Internacional do Trabalho)
A Convenção n.º 111, em seu artigo 1°, limita as formas de discriminação aos casos em que haja exclusão ou preferência fundada na raça, cor, sexo, religião, opinião política, ascendência nacional ou origem social. O Programa Brasil, Gênero e Raça, no entanto, não se limita a esses segmentos, e, entre outros, também inclui os casos de orientação sexual, estado de saúde, deficiência, cidadania, obesidade. Isto se deve a duas razões: primeiro, o Brasil também é signatário de outras Convenções da OIT, como trabalho parcial, equidade de remuneração entre homens e mulheres, proteção às pessoas portadoras de deficiência, etc; segundo, a promoção do bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação, é um dos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil (art. 3º, IV, da Constituição Federal de 1988).
(...)
Esses Núcleos expressam a concretização da política pública de combate a todas as formas de práticas discriminatórias - estado de saúde, gênero, assédio moral, deficiência, assédio sexual, HIV/AIDS, classe social, idade, obesidade, orientação sexual, cidadania, etc. - , os quais contam a parceria de diversas entidades governamentais e não-governamentais: INSS, Secretaria Estaduais e Municipais do Trabalho, Ministérios, etc. Essas entidades ajudam na compreensão e no dialogo com os segmentos discriminados, uma vez que todos os indivíduos, respeitadas as diferenças, integram a sociedade sem distinção de qualquer natureza.
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O STF E O CONTEÚDO JURÍDICO DO CRIME DE RACISMO
Valerio de Oliveira Mazzuoli
Em 17 de setembro de 2003 o Supremo Tribunal Federal brasileiro, por maioria de votos, indeferiu o Habeas Corpus impetrado por Siegfried Ellwanger, que havia sido condenado pela justiça gaúcha pela prática do crime de “racismo” praticado contra os judeus.
O julgamento deste Habeas Corpus (n.º 82424-RS) foi talvez um dos mais emblemáticos, dentre todos aqueles já julgados pelo STF, desde a promulgação da Constituição brasileira de 1988.
Ellwanger é um editor e autor de Porto Alegre (RS), que publica livros de cunho claramente nazista e anti-semita. Pela sua conduta foi condenado pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul pela prática do crime de racismo que, nos termos da Constituição brasileira, é imprescritível e inafiançável. Um pedido de Habeas Corpus em seu benefício foi apresentado ao Superior Tribunal de Justiça, tendo sido o benefício negado por este tribunal. Eis que, então, novo pedido de Habeas Corpus é impetrado, mas dessa vez ao Supremo Tribunal Federal, sob o argumento de que o impetrante não poderia ser condenado por crime de racismo, uma vez que os judeus não são uma “raça”, a exemplo do que seriam os negros, etc.
É evidente que o conceito de “raça” deve ser analisado de acordo com o seu conteúdo jurídico, sob pena de esvaziar-se o conteúdo constitucional da prática do racismo. O núcleo mínimo conceitual da prática do racismo encontra-se na Convenção Internacional sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial, de 1965, elaborada sob os auspícios da Organização das Nações Unidas. Esta Convenção, no seu art. 1º, estabelece que discriminação racial significa qualquer distinção, exclusão, restrição ou preferência baseadas em raça, cor, descendência ou origem nacional ou étnica. No seu art. 4º, a Convenção considera que está no âmbito do direito penal e na estrutura da prática do racismo, a difusão de idéias baseadas na superioridade ou ódios raciais, que é exatamente o caso do crime praticado por Ellwanger.
O direito constitucional brasileiro manda incorporar automaticamente ao ordenamento jurídico interno todos os preceitos contidos nos tratados internacionais de proteção dos direitos humanos ratificados pelo Brasil, atribuindo-lhes o status de normas constitucionais, como se depreende da interpretação do art. 5.º, §§ 1.º e 2.º da Constituição brasileira de 1988.[1]
Portanto, andou bem o STF no que indeferiu o HC impetrado pelo patrono de Ellwanger. Se o sofisma relativo ao conceito de “raça” viesse a ser apoiado pelo STF, como se manifestou o Min. Maurício Corrêa, isso causaria um impacto bastante negativo, de alcance geral, contrário ao respeito aos direitos humanos previstos pela Constituição brasileira. De fato os judeus não são uma raça, assim como também não são uma raça os brancos, o negros, os mulatos, os índios, os ciganos, os árabes e quaisquer outros integrantes da espécie humana. Também não são raça os grupos religiosos, como os católicos, os protestantes, os muçulmanos e outros integrantes desta ou daquela crença.
Por oito votos a três, os ministros do STF concluíram que quem propaga idéias discriminatórias contra judeus comete o crime de racismo. Segundo o presidente do STF, Min. Maurício Corrêa, desde a promulgação da Constituição de 1988, este foi “o caso mais emblemático, no contexto dos direitos civis”.
O ex-presidente do STF, Min. Marco Aurélio Mello, votou pela concessão do Habeas Corpus, por entender que Ellwanger não praticou o crime de racismo. O Min. Sepúlveda Pertence votou a favor da condenação. Como sete ministros já haviam se manifestado contra as pretensões do editor em sessões anteriores, foi mantida a condenação por racismo, que é um crime que não admite esquecimento.
Apesar de o ponto central da discussão em plenário ter sido o alcance da expressão “racismo”, contida no inciso XLII do art. 5º, da Constituição (“a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei”), o julgamento pelo STF foi muito mais além – falando em termos de direitos humanos e liberdades fundamentais –, pois deixou uma lição para o direito brasileiro, no que tange à efetiva proteção dos direitos humanos no Brasil. O Tribunal, por maioria, acompanhou o voto proferido pelo Min. Maurício Corrêa no sentido do indeferimento do writ, sob o entendimento de que o racismo é antes de tudo “uma realidade social e política”, sem nenhuma referência à raça enquanto caracterização física ou biológica, refletindo, na verdade, em reprovável comportamento que decorre da convicção de que há entre os diversos grupos humanos uma hierarquia, suficiente para justificar atos de segregação racial, inferiorização e até mesmo de eliminação de pessoas, como ocorreu no Holocausto da Alemanha nazista.
Louva-se o Supremo Tribunal Federal brasileiro pela decisão relativa ao HC 82424-RS, que foi inspirada nos valores da dignidade da pessoa humana e da prevalência dos direitos humanos, princípios estes que conferem à Carta Constitucional brasileira suporte axiológico para a interpretação de quaisquer conceitos jurídicos envolvendo violações de direitos humanos.
Valerio de Oliveira Mazzuoli é mestre em Direito Internacional pela Faculdade de Direito da UNESP, professor de Direito Internacional Público e Direitos Humanos no Instituto de Ensino Jurídico Professor Luiz Flávio Gomes (IELF), em São Paulo, e nas Faculdades Integradas Antônio Eufrásio de Toledo, em Presidente Prudente-SP. Membro da Sociedade Brasileira de Direito Internacional (SBDI) e da Associação Brasileira de Constitucionalistas Democratas (ABCD). Advogado no Estado de São Paulo.
Este artigo é parte integrante do site www.dipnet.com.br. Publicado em 15/01/04
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[1] Sobre o assunto, vide MAZZUOLI, Valerio de Oliveira, Direitos Humanos, Constituição e os Tratados Internacionais: estudo analítico da situação e aplicação do tratado na ordem jurídica brasileira, São Paulo: Editora Juarez de Oliveira, 2002, cap. VII.
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